Detalhe de "Plan de la baye et de la ville de Rio Janeiro", autor Duguay-Trouin, ano 1740

O HORROR! O HORROR! 

(parte 2 de 2)

Este magnífico mapa conta a história da invasão de René Duguay-Trouin em 1711 ao Rio de Janeiro e foi desenhado e escrito pelo próprio corsário francês. Vale a pena acessar a imagem ampliada para ler as legendas, conhecer os detalhes das batalhas e ver como era a cidade naquela época.

No dia 12 de setembro de 1711, as embarcações francesas chegaram à Baía de Guanabara durante um intenso nevoeiro. Quando a sentinela da Fortaleza de Santa Cruz percebeu a invasão, os franceses já estavam fora do alcance de seus canhões. Intensas batalhas foram travadas, e os franceses conquistaram posições estratégicas; ocuparam com 500 homens a Ilha das Cobras (próximo à atual Praça Mauá) e desembarcaram 3.800 homens na praia de São Diogo (região da Rodoviária Novo Rio). Tomaram sem resistência os morros de São Diogo, da Providência, do Livramento, da Saúde, de São Bento, do Castelo e de Santo Antônio. 

À noite, durante intenso bombardeio que destruiu grande parte do Centro e matou centenas de pessoas, o governador Francisco de Castro Morais se refugiou no interior do Estado. Em meio a medonhas trovoadas e chuvas, a população em pânico também abandonou a cidade na escuridão da madrugada, os caminhos congestionados pelas carroças presas em enormes atoleiros. Os mais ricos foram para a região serrana e os menos abastados, para os subúrbios. Muitos se embrenharam nas matas e mangues da Baía de Guanabara, sem destino. As poucas forças de combate do Rio de Janeiro foram rapidamente eliminadas, inclusive o bravo comandante Bento do Amaral Coutinho e seus soldados, mortos em violenta refrega perto do Campo de Santana (veja legenda das posições "b" e "c" no mapa ampliado). 

O saque foi espantoso. Tudo quanto havia de valioso ao alcance dos franceses eles transportaram para bordo: ouro da Casa dos Contos, açúcar e outras cargas dos trapiches, coisas belas das igrejas e das casas particulares. Arquivos foram remexidos e queimados. O Rio foi espoliado, todas as residências foram assaltadas, prédios públicos destruídos, casebres incendiados e igrejas pilhadas. Homens eram mortos por diversão e as mulheres, estupradas. O que não podia ser levado era destruído, principalmente o patrimônio documental e artístico. A barbárie chegou a tal ponto que o próprio comandante Duguay, tentando controlar a situação, puniu três de seus soldados com a decapitação em praça pública. Os franceses ficaram aqui durante dois meses.

Absolutamente subjugado, o governador Francisco de Castro aceitou assinar uma convenção de rendição em que se obrigava a pagar grande soma em dinheiro, entre outras condições, pelo resgate da cidade. Um dia depois da assinatura desse "contrato", chegou à cidade para expulsar os invasores uma tropa de 6.000 homens chefiada por Antonio Albuquerque Coelho de Carvalho, governador da capitania de São Paulo e Minas. Entretanto, como o governador do Rio havia concordado oficialmente com a rendição, Antonio Carvalho ficou legalmente impedido de atacar os franceses e nada pode fazer.

Recebido o resgate de 240 contos de réis em dinheiro (ou 616.000 cruzados, contados moeda por moeda na Rua da Quitanda, 89 - esquina da do Sabão), 100 caixas de açúcar e 200 bois, os invasores ainda fizeram uma "feirinha", em que parte dos produtos do saque foi vendida de volta à população da qual fora roubada. Em 13 de novembro, certamente às gargalhadas, as tropas francesas partiram do Rio de Janeiro incendiando todos os navios que estavam na Baía de Guanabara e deixando para trás uma cidade totalmente devastada.

O governador Francisco Morais e Castro foi julgado pelos portugueses e condenado à prisão perpétua numa fortaleza na Índia, onde morreu anos depois. O corsário Duguay-Trouin é herói na França, homenageado até hoje.

Celso Serqueira e-mail do autor

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